Sobre o meduloblastoma
O que é meduloblastoma?
O meduloblastoma é o tumor cerebral maligno mais comum em crianças, correspondendo a quase 20% de todos os tumores cerebrais nessa população. Ele se origina em células embrionárias (fetais) e normalmente é descoberto nos primeiros 5 anos de vida. Ele acomete o sistema nervoso central e se desenvolve no cerebelo. O cerebelo é a parte do cérebro responsável pela coordenação dos músculos, equilíbrio e movimento. O tumor cresce rapidamente e pode se espalhar para outras partes do cérebro, porém raramente se espalha para outras partes do corpo.
O meduloblastoma possui uma incidência anual geral de aproximadamente 5 casos a cada 1 milhão na população pediátrica. Cerca de 75% dos casos ocorrem em crianças com menos de 10 anos, com o pico de incidência entre 1-4 e 5-9 anos de idade. A predileção do tumor por sexo e a incidência específica por idade variam entre os grupos. O meduloblastoma, assim como todos os cânceres infantis, é considerado uma doença rara, pois afeta uma parcela pequena da população. Isso significa que a obtenção de financiamento para pesquisas é muito mais difícil do que para doenças mais prevalentes.
Sintomas
Os sintomas do meduloblastoma geralmente aparecem quando o tumor cresce ou causa aumento da pressão no cérebro e podem persistir mesmo após o tratamento. Os pacientes podem desenvolver:
- dificuldade para andar, manter o equilíbrio e realizar movimentos delicados;
- dor de cabeça, náusea, vômito, visão borrada/duplicada, sonolência extrema, confusão, convulsões e desmaios;
- fraqueza ou dormência nos braços e/ou pernas, alterações no funcionamento da bexiga e/ou intestino e dor na coluna;
- nos poucos casos em que o tumor se espalha para outras partes do corpo pode haver tosse, dor no peito e falta de ar, aumento dos linfonodos e dor nos ossos.
Dependendo da localização do tumor, os sintomas podem variar.
Tipos de meduloblastoma
Os meduloblastomas são classificados em quatro grupos principais com base em fatores moleculares e genéticos e em quatro subtipos histológicos. Essa classificação detalhada é usada para determinar o prognóstico (parecer médico, baseado no diagnóstico, sobre a provável evolução e desfecho da doença) e orientar o tratamento. Os quatro grupos principais são definidos de acordo com o comportamento do tumor:
Grupo WNT (wingless)
Esse é o tipo menos comum de meduloblastoma, correspondendo a apenas 11% de todos os meduloblastomas. Os tumores desse grupo são caracterizados por alterações na via de sinalização WNT (uma rota bioquímica importante que pode afetar o crescimento de tumores). Afetam ambos os sexos igualmente e são comumente diagnosticados em crianças com 6 a 10 anos de idade. Esse tipo de meduloblastoma tem o melhor prognóstico: quase 90% dos pacientes sobrevivem por mais de 5 anos após o diagnóstico.
Grupo SHH (Sonic Hedgehog)
Esse tipo de meduloblastoma é comum em pacientes mais jovens (com menos de 3 anos de idade) e naquelas com 16 anos ou mais. Esses tumores correspondem a 25% de todos os meduloblastomas. O subgrupo SHH é associado a mutações na via Sonic Hedgehog, que controla o desenvolvimento de células embrionárias e também afeta o crescimento de tumores.
Grupo 3
Os tumores do Grupo 3 são os mais agressivos, com uma taxa de sobrevida global de 50%, e tendem a se espalhar pelos ventrículos do cérebro e pela medula espinhal. O Grupo 3 corresponde a aproximadamente 25% de todos os meduloblastomas e é normalmente diagnosticado em pacientes com 3 a 5 anos de idade.
Grupo 4
Esse é o maior e mais comum grupo dos meduloblastomas, representando 35% de todos os casos. Os tumores do Grupo 4 ocorrem mais em meninos. Tumores desse grupo tem bom prognóstico, exceto em caso de recidiva. O meduloblastoma infantil do Grupo 4 é o foco da pesquisa apoiada pela MBI (The Medulloblastoma Initiative), que, em 2024, aprovou dois ensaios clínicos para testar novos tratamentos.
Diagnóstico
Inicialmente, o processo diagnóstico envolve o histórico médico do paciente e uma avaliação dos sinais e sintomas relatados. Os testes e procedimentos geralmente utilizados para o diagnóstico do meduloblastoma incluem:
- Exame neurológico: testa a visão, a audição, o equilíbrio, a coordenação e os reflexos, a fim de identificar qual parte do cérebro pode estar sendo afetada pelo tumor.
- Exames de imagem: capturam imagens do cérebro para determinar o tamanho e a localização do tumor. Esses exames também podem revelar a presença de pressão ou bloqueios no líquido cefalorraquidiano. A tomografia computadorizada e ressonância magnética são os exames mais comuns.
- Amostra tecidual: embora biópsias sejam incomuns em casos de meduloblastoma, podem ser feitas em certas situações. Envolvem a utilização de uma agulha para retirar uma amostra do tumor, que é, então, analisada em laboratório para determinar se é um meduloblastoma.
- Punção lombar: envolve a inserção de uma agulha entre dois ossos da coluna inferior para retirar o líquido que envolve a medula espinhal (cefalorraquidiano). Esse líquido é testado em laboratório para verificar a presença de células tumorais. A punção lombar deve ser realizada somente após controle da pressão intracraniana e remoção do tumor.
Prognóstico (chance de recuperação)
O prognóstico, ou seja, a chance de recuperação de uma pessoa com meduloblastoma, depende de vários fatores, como o tipo molecular do tumor, o estágio, a quantidade de tumor removida, a idade, o estado de saúde do paciente no momento do diagnóstico e a resposta ao tratamento. Nos primeiros anos após o diagnóstico, a taxa de mortalidade é próxima de 15%. Com os tratamentos atuais, a taxa de cura pode chegar até 70-80% em crianças e 50-60% em adultos. A taxa de sobrevivência em 5 anos para meduloblastoma é de aproximadamente 80,6%, mas pode variar.
O tipo específico de meduloblastoma também afeta o prognóstico. Os tumores ativados pela via WNT têm um prognóstico melhor do que aqueles ativados pela via SHH ou do Grupo 3 e 4. Em casos de recorrência, a taxa de sobrevivência em 5 anos cai para menos de 40%.
Tratamento
Os protocolos atuais de tratamento para o meduloblastoma, introduzidos em grande parte na década de 1980 e que, em sua maioria, permaneceram inalterados, dependem fortemente de métodos citotóxicos e não direcionados – como a radioterapia convencional com raio X, que aplica radiação a todo o tecido em volta do tumor. Apesar dos avanços, as taxas de mortalidade para meduloblastoma continuam elevadas, e muitos sobreviventes sofrem efeitos colaterais de longo prazo devido à radioterapia e quimioterapia citotóxica, assim como dificuldades cognitivas, problemas psicológicos e sociais e até deficiências hormonais. Esses efeitos podem exigir apoio contínuo para melhorar a qualidade de vida dos pacientes, principalmente crianças, que são muito mais sensíveis aos efeitos da radioterapia, visto que seus corpos ainda estão crescendo e em desenvolvimento.
O tratamento do meduloblastoma geralmente combina cirurgia, radioterapia e quimioterapia. O tratamento inicial envolve a remoção cirúrgica do tumor, seguida de radioterapia e quimioterapia, dependendo do tipo e localização do tumor e do quanto ele se espalhou. Terapia com feixe de prótons (um tipo de radioterapia mais precisa do que o tratamento com raio X convencional, direcionada especificamente ao tumor) pode ser recomendada para reduzir os danos a outros órgãos. Os tratamentos disponíveis atualmente estão descritos em detalhe abaixo.
- Cirurgia para aliviar a pressão intracraniana: o meduloblastoma pode crescer e bloquear o fluxo do líquido cefalorraquidiano, causando um acúmulo que pressiona o cérebro. Para reduzir essa pressão, um cirurgião cria um caminho para que o líquido flua para fora do cérebro. Esse procedimento pode ser combinado com a cirurgia de remoção do tumor.
- Cirurgia para remover o tumor: o objetivo da cirurgia é remover todo o tumor. No entanto, se ele estiver localizado perto de estruturas importantes do cérebro, isso pode não ser possível. A maioria das pessoas com meduloblastoma precisará de tratamentos adicionais após a cirurgia para eliminar células cancerosas restantes.
- Radioterapia: A radioterapia utiliza feixes de energia poderosos para matar células cancerosas. Essa energia pode vir de raios X, prótons ou outras fontes. Durante a radioterapia, uma máquina direciona os feixes de energia para pontos específicos do corpo. Costuma ser realizada após a cirurgia.
- Quimioterapia: a quimioterapia usa medicamentos para matar células cancerosas. Geralmente, crianças e adultos com meduloblastoma recebem esses medicamentos por meio de injeções intravenosas. A quimioterapia pode ser administrada após a ressecção cirúrgica ou radioterapia e, em alguns casos, pode ser feita ao mesmo tempo que a radioterapia.
Perspectivas futuras
Ensaios clínicos com novos medicamentos também podem ser uma opção para alguns pacientes. Os ensaios clínicos recrutam participantes elegíveis para estudar novos tratamentos, como imunoterapia, ou novas formas de usar tratamentos existentes, como diferentes combinações ou duração de radioterapia e quimioterapia. Esses estudos oferecem aos pacientes a oportunidade de experimentar opções de tratamento mais recentes, embora os riscos de efeitos colaterais não sejam totalmente conhecidos.
Desde a sua criação em 2021, a MBI vem juntando recursos para achar uma cura para os meduloblastomas do Grupo 4. A MBI conseguiu reunir apoio financeiro para um consórcio de 14 laboratórios nos Estados Unidos, Alemanha e Canadá (o Cure Group 4 Consortium), liderado pelo Dr. Roger Packer do Children’s National Hospital. O grupo já fez uma descoberta significativa sobre o provável mecanismo de desenvolvimento das células que dão origem ao meduloblastoma.
Além disso, em menos de 3 anos, dois ensaios clínicos já foram aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para testar dois novos tratamentos:
Estudo 1
Também chamado de MATCHPOINT – ataca os tumores de duas maneiras: 1) treina as próprias células do paciente para identificar e destruir as células cancerígenas e 2) usa um medicamento adicional para eliminar o sistema de defesa do tumor.
Estudo 2
Está testando uma vacina de mRNA – semelhante à vacina contra a COVID-19, mas mais personalizada, já que utiliza as células do próprio paciente. A nanotecnologia é usada para criar a vacina. Uma vez injetada, a vacina gera uma resposta imune direcionada para destruir os tumores.
Mais três ensaios clínicos serão protocolados entre 2024 e 2025. Espera-se que esse esforço apoiado com recursos filantrópicos encontre a cura para os meduloblastomas do Grupo 4.
Referências
https://www.mayoclinic.org/diseases-conditions/medulloblastoma/cdc-20363524/
https://mbinitiative.org/pt/clinical-trails-approved/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK431069/
https://www.cancer.gov/rare-brain-spine-tumor/tumors/medulloblastoma
https://ascopubs.org/doi/10.1200/JCO.2017.72.7842
https://medulloblastoma.org/medulloblastoma-statistics/
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1878747923014630
https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/prognstico
https://mbinitiative.org/wp-content/uploads/2024/09/MBI-Report-September-2024-EN.pdf
https://mbinitiative.org/wp-content/uploads/2024/04/Report-MBI-Abril-2024-PT.pdf